PERFORMANCE Eduardo B. Penteado
Bebia o velho poeta num canto de bar Sozinho, esperando um metafórico apagar de luzes Melancólico Equilibrista De lados opostos de seu bastão de cristal Um cigarro seca o copo Um gole apaga a chama “Estou livre do verso, estou livre da trama!” Jovens sóbrios caçoam do velho O garçom ébrio reclama Então, à meia-noite, Voa longe a tampa do tempo No canto escuro do barzinho sisudo Nasce um personagem absurdo “Sou o bêbado, sou o vagabundo, sou o maior equilibrista do mundo!” “Silêncio,” bradou uma voz lá do fundo E o poeta, moleque, fez-se de surdo, “Sou seu beatnik, sou seu punk, sou o que há de mais imundo!” Calou-se a platéia de incrédulos debutantes
Um garçom sóbrio, inexplicável No qual ninguém havia reparado Trouxe um candelabro de ossos Uma a uma, as lâmpadas se apagaram E se pôs a funcionar o gramofone quebrado
O futuro passou com escândalo Silenciosamente, fez-se presente E fugiu pelo espelho da contradição, Deixando o poeta no meio do salão:
“Sim, vivi a vida, talvez Como poucos coçaram a ferida Como poucos comeram-na viva Não sei, é claro O que virá em seguida Um sol hepático Uma lua enfisemática Uma aurora boreal sifilítica
Mais um dia Homem, sorria!
Nunca olhei horizontes Pois cada curva me dispersa Eu olhava o que eu seria E via o que eu não queria O tempo passa, e a vida, devassa, Escancara aos abutres a minha carcaça
A fonte da vida! A chama da vida! A fonte apaga a chama Que a água vaporiza…
Venham, abutres!” E todos nós fomos.