Bolero de inverno no cerrado
No cerrado, seco, o sol da manhã Nos tortos galhos, o ipê, a cortesã De um inverno, em uma festa pagã Desperta o capricho do deus tupã Degustando a aurora tal um leviatã
E numa angústia, o orvalho, num afã Do céu azul, num infinito, de malsã Craquela o dia no seu tão árido divã Do duro fado, tão pouco gentleman E tão árido, tal uma agridoce romã
E vem o alvor, com o frígido de hortelã Bafejando poeira cheia de balangandã Tintando a flora em um rubro poncã Zunindo o vento tal um som de tantã Num bolero ávido por um outro amanhã… São gemidos, uivos, sofreguidão Correndo pelo sulco do cascalhado chão Emergindo desse pântano, ressequida solidão.
© Luciano Spagnol poeta do cerrado
Brasília, DF